DIREITOS SOBRE TIPOS GRÁFICOS
Gustavo Martins de Almeida *
A celebração dos 80 anos da criação da fonte
Times New Roman, noticiada pelo Caderno Prosa & Verso do jornal O Globo, de
12.01.13, (http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2013/01/12/o-fenomeno-times-new-roman-481987.asp)
serviu de estímulo á elaboração deste artigo. Procurei, no entanto, o viés da
proteção das fontes pelo direito autoral, já que são claramente, a meu ver,
“obras de desenho” previstas e protegidas pelo art. 7º, inc. VIII, da Lei
9.610/98, a lei brasileira de direito autoral. Também a Convenção de Berna, que
regula o direito autoral no mundo, estabelece a proteção dos desenhos, o que é
assegurado pelos seus 166 países signatários. Advirto que indico muitos sites,
pois a referência visual é muito útil para complementar o texto, que sem ela ficaria árido.
Curiosamente a polêmica sobre a proteção
das fontes é muito grande no mundo inteiro, sendo certo que, apesar de passível
de concessões de licença limitadas, o pedido de sanção para o uso indevido das
fontes não é comum. Poucas empresas
reclamam judicialmente do uso indevido de fontes, mas há litígios, como o que a
empresa americana Font Bureau move contra a rede de TV NBC cobrando US$ 2M por
uso indevido de fontes (http://arstechnica.com/tech-policy/2009/10/font-bureau-clashes-with-nbc-over-font-licensing/).
A pesquisa para este artigo passou pela
constatação da existência de centenas de milhares de fontes, nome dado aos
tipos gráficos, isto é, às letras de texto que obedecem a determinado padrão
visual. Do ótimo artigo, “direito de
propriedade intelectual sobre tipografia”, de Vivian Amaro Czelusniak e Dario
Eduardo Amaral Dergint, cito o seguinte trecho: “Uma definição genérica para
tipografia poderia ser então simplesmente a de ‘uma escrita com tipos’, isto é,
uma escrita realizada através de símbolos padronizados, formados e replicados
uniformemente, totalmente despersonalizados, e representando basicamente
letras, números, sinais de pontuação e outros auxiliares” (http://www.direitoautoral.ufsc.br/gedai/wp-content/uploads/2011/01/art4_direito-de-propriedade-intelectual-sobre-tipografia-caso-da-hi-technologies.pdf).
No artigo os autores narram a
tentativa frustrada de registro de nova fonte em órgãos públicos. Acrescento
que seria possível registrar esses tipos num Cartório de Títulos e Documentos,
o que provaria a anterioridade da criação da obra.
A era da imagem cada vez mais identifica
símbolos e culturas por meio de aspectos visuais, como as logomarcas de
Coca-Cola, IBM, Apple e Mc Donalds, apenas para citar alguns ícones
contemporâneos, cuja visualização das fontes e cores as associa de imediato a
determinada empresa ou significado.
Algumas dessas fontes estão disponíveis na
internet, como por exemplo, a da Coca-Cola (http://www.fonts2u.com/coca-cola-ii.font),
aparentemente sem restrição de uso individual, mas certamente o uso desse tipo
de letra para a identidade visual de outro refrigerante, além de concorrência desleal,
poderia justificar ação judicial só pelo uso indevido da fonte.
Outros tipos são
de uso livre, mas em mutação. Notem que os novos programas da Microsoft
trocaram a fonte padrão Times New Roman pela Calibri (http://www.microsoft.com/typography/default.mspx).
Aliás, sobre a Times New Roman, li comentário que, por ser mais estreita,
ocuparia menos espaço e permitiria a publicação de mais conteúdo nas colunas.
Recentemente a
Folha de São Paulo contratou a criação de fonte para suas manchetes, por
designer famoso, de modo a criar nova identidade visual. Certamente ele deve ter
cedido os direitos sobre o produto criado para a empresa que publica o jornal.
As facilidades
da informática fazem com que o nobre e difícil ofício dos artesãos criadores de
tipos com buril (daí o termo burilado) e as atividades das antigas fundições
sejam disponibilizados em softwares gratuitos. Mas ainda assim a criatividade
humana se serve da tecnologia para conceber novos tipos gráficos. Achei alguns
exemplos, como o curioso http://www.crimestipograficos.com/?go=home,
o interessante http://www.a2-type.co.uk/, o
infindável http://www.fonts.com/, e o estudo da
UNESCO sobre proteção e licenciamento das fontes, http://scripts.sil.org/cms/scripts/page.php?site_id=nrsi&id=UNESCO_Font_Lic.
Ainda dentro da
esfera de criação e proteção, há um programa do MEC que ensina a criar fontes, disponibilizado
no site Portal do Professor, http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=16634,
e, o mais curioso, um que registra, identifica e transforma a sua caligrafia em
fonte, de modo a que a pessoa possa “digitar uma carta manuscrita” com sua
própria letra, http://www.geek.com.br/posts/9179-site-transforma-caligrafia-em-fonte-tipogr-fica.
Embora a criação
e a glória da notoriedade pareçam ser o maior prêmio para os seus criadores, o
setor editorial deve ficar atento, pois há fontes cuja utilização exige licença
(http://www.augetype.com/site-utilsfiles/termos-para-fontes-pt.html)
e o seu uso indevido pode gerar reclamações (http://adg.org.br/blog/blog/carta-aberta-ao-governo-federal-adg-brasil/)
e até demandas judiciais. O fato é que as belas e variadíssimas fontes sem
dúvida são protegidas legalmente e a sua utilização pode ser controlada.
*Submeti a
primeira versão deste texto às excelentes designers Baíta Sicupira e Bitty N.
Silva Pottier e o resultado das conversas me deu a certeza da relevância do
tema.
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